Um projeto de pesquisa liderado pela professora da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), Marta Pereira, quer usa extrato de Pau de Balsa, uma espécie da flora amazônica parente do quiabo, para solucionar um dos problemas ambientais mais graves que aflige a Amazônia, o uso de mercúrio no garimpo de ouro (em terra ou leito de rios).
Por conta da poluição ambiental causada pelo mercúrio no garimpo de ouro no rio Madeira, em setembro a Polícia Federa deflagrou a Operação Boiúna, que destruiu 277 balsas de ribeirinhos entre os municípios de Manicoré e Humaitá, causanAdo uma comoção política que mobilizou toda a bancada do Amazonas em Brasília e gerou fortes reações contra o governo do presidente Luís Inácio Lula da Silva.
O mercúrio é um um metal pesado utilizado na separação do ouro dos demais sedimentos, e que causa contaminação de rios e peixes. Humanos também são contaminados ao comer esses peixes ou beber da água de um rio envenenado pelo mercúrio.
O projeto de Marta Pereira usa uma planta nativa da Amazônia e de outras regiões das Américas como uma possibilidade promissora para substituir o mercúrio nessa função de separação do ouro dos sedimentos.
A hipotese central parte da constatação de que extração de metais de solos e rios existe desde muito antes do emprego do mercúrio, e comunidades de garimpeiros da região de Tadó, no Departamento de Chocó, Colômbia, mantiveram viva por séculos a tradição do garimpo artesanal de ouro e prata com o uso de plantas locais.
Recentemente, os ribeirinhos do baixo Rio Madeira, no estado do Amazonas, também passaram a garimpar usando uma das plantas utilizadas no garimpo artesanal do ouro nas comunidades colombianas.
Choque de conhecimentos gera resultado
Os conhecimentos tradicionais podem inspirar a ciência. E foi a partir da experiência dessas comunidades colombianas e do baixo Madeira que teve início o projeto “Potencial Biotecnológico de Ochroma pyramidale como substituto do mercúrio na mineração de ouro”. Além de Marta Pereira, o projeto envolve pesquisadores das Universidades Federais de Rondônia e do Rio de Janeiro e do Instituto Militar de Engenharia, com a participação técnico-logístico da Cooperativa dos Garimpeiros do Rio Madeira (COOGARIMA).
A planta em questão é chamada no Brasil é chamada de Pau de Balsa, muito conhecida desde o Sul do México, passando por Colômbia, Peru e a região norte do Brasil. Na Amazônia, a planta, além da extração de ouro, tem sido também amplamente utilizada no reflorestamento de áreas desmatadas.
Da família do quiabo e do algodão (Malvaceae), o “pau-de-balsa” produz uma madeira leve e resistente, que vem sendo bastante utilizada em diversas regiões do mundo, especialmente na área da engenharia e ciência dos materiais. China e Estados Unidos são os maiores consumidores da madeira oriunda do Pau de Balsa.
Procedimentos orientados pelos caboclos
O primeiro passo dos pesquisadores foi o de tentar criar um procedimento mais eficiente e sustentável na separação do ouro dos demais sedimentos, usando, inicialmente, o extrato bruto do pau-de-balsa. O extrato é feito umedecendo com água uma folha média e a espremendo manualmente.
A participação dos garimpeiros da COOGARIMA foi fundamental nessa fase do estudo. Não apenas eles obtiveram o concentrado de sedimentos para análise, como a presença de um dos garimpeiros nos testes experimentais no laboratório foi imprescindível: o olhar para identificar “fagulhas” de ouro e o sincronismo no balançar da “cuia” e “batéia” são expertises deles, e se unem ao conhecimento científico numa construção coletiva de saberes.
Os primeiros experimentos em laboratório foram animadores e houve a aglutinação do ouro como ocorre quando se usa mercúrio. No processo convencional, utiliza-se o mercúrio metálico (Hg0), que se une ao ouro (amalgamação), num processo denominado de concentração gravimétrica (quando partículas de diferentes densidades, tamanhos e formas são separadas uma das outras por ação da força de gravidade ou por forças centrífugas).
O ouro do Rio Madeira é um ouro muito fino, são “fagulhas” difíceis de serem separadas dos demais sedimentos e resíduos obtidos no processo de concentração gravimétrica. Já a levigação (método que utiliza líquidos para promover a separação de misturas heterogêneas entre sólidos) conseguida com o extrato da Pau de Balsa foi eficiente na separação dessas “fagulhas”, com a grande vantagem de ser feita sem nenhuma substancia tóxica a ser lançada no meio ambiente.
Os pesquisadores acreditam que os saberes tradicionais de comunidades de garimpeiros artesanais podem, em breve, retornar às populações locais em forma de conhecimento científico, num trabalho coletivo para reduzir os prejuízos ambientais causados pelo uso do mercúrio, além de acabar com as tensões com a polícia, órgaos ambientais e os políticos em Brasíla.
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